1975. Resolvi voltar ao batalhão. Servir novamente, só que dessa vez como oficial médico. Havia dado baixa em 1969, em uma situação meio duvidosa, meio visto como subversivo, aquelas coisas da época...José Dirceu preso, Gersinho preso, pano vermelho no cruzeiro de Passa Quatro, eu detido aqui, sem saber o que iria acontecer comigo... Bastava saberem que alguém era de Passa Quatro e já era visto meio “de esgueio”... O capitão Fagundes me liberou, mas depois resolvi voltar, não mais como soldado...
Fui trabalhar na enfermaria do batalhão. Direito a casa, jardineiro,ordenança, cheque especial do banco do Brasil, espada, porte de arma, continências de todos aqueles sargentos que antes achavam que mandavam em mim. Mordomia total. Gostei.
Apresentação na formatura matinal. O cel Paulo Tavares me apresentou e o batalhão desfilou também para mim. Verdade: o médico faz parte do estado maior do batalhão e quando ele passa tem aquele negócio de “olhar à direita”, reverências mil. Me sentia o próprio presidente da república com tudo aquilo. Só que o coronel me chamou ao lado e perguntou: — “De onde você veio?” . Do 12 RI, de Belo Horizonte, respondi... — É, mas aqui não usamos farda com calça boca de sino não, viu?
Assumi a enfermaria. O mini-hospital do batalhão. O cargo é para capitão, mas o capitão médico da época estava doente, então assumi eu. E ganhei como capitão. Na época isso era assim. Em 1 ano que fiquei lá quase que deu para comprar toda minha aparelhagem de oftalmologia. E haviam também as diárias, das CS (comissão de seleção ), quando saíamos andando pelas cidades vizinhas escolhendo os soldados que iriam servir no ano seguinte. Olhem, era muito dinheiro mesmo. Na época até valia a pena ficar. Só não continuei no exército porque seria transferido, e eu queria ficar em Itajubá mesmo. O chefe do serviço de saúde era o capitão Machado, dentista, um grande chefe, um grande amigo. Uma pessoa admirável e muito querida. Graças a Deus até hoje eu o vejo bem, com saúde, exatamente como há 30 anos atrás.
Essas CS eram interessantes porque eu resolvia quem iria servir e quem não. Os doentes eram cortados, mas eu também tirava todos que pudessem ser atrapalhados em seus estudos. E também os que não queriam servir. Só colocava, praticamente, voluntários. E tem alguns casos interessantes, como o do filho de um amigo do papai. O papai me chamou e me disse que esse menino iria fazer vestibular e não poderia servir. Tudo bem, o dispensei. Só que ele não passou no vestibular, e veio me procurar, depois da cs terminada, e me disse que iria pedir revisão porque agora queria servir ao exército. Me deu vontade de estrangulá-lo e jogá-lo no rio. Por sorte consegui convencê-lo a esquecer tudo... Hoje ele é empresário em Brasília. Outra vez um irmão de uma ex-namorada chegou , já carequinha e entrou na fila dos pelados ( por sinal, acho que essa era a fila mais fedida do mundo...), com certeza absoluta de que estaria “fisgado”. Eu o liberei.
Só o pessoal de Passa Quatro “dançou” com minhas CSs. Quando fui fazer lá o Cel Tavares resolveu ir junto comigo. Meus primos até hoje não me perdoam por tê-los colocados todos. Mas não foi minha culpa...
Eu comprava os medicamentos. Chegou uma verba astronômica para comprá-los. E eu não precisava de nada. Quando falei ao sub-comandante, um tal de Feijão, ele achou ruim: —mas tem de gastar! Se o dinheiro veio é para isso! Tem de ter competência! (velhinho gordinho e bobo...) e um monte de besteiras mais. Fui para Belo Horizonte fazer as compras e o dinheiro era tanto, e eu havia comprado tanta bobagem desnecessária que acabei comprando também fitas para uroanálise de diabéticos, sendo que eu sabia que não tínhamos diabéticos. Burrocracia brava!
E a comida, aquele papo que era a mesma para soldados e oficiais? Eu servi dos dois lados. No rancho (soldados) feijão duvidoso, com abóbora, arroz, uma carne ruim, umas gelatinas estranhas, no cassino (oficiais), lazanhas, filés, pratos sofisticados, sobremesas finas. Só espero que os soldados cozinheiros tenham gostado de mim, porque um deles me disse depois que, quando não gostavam dos oficiais cuspiam nos bifes, esfregavam por dentro das cuecas e mil coisas piores. Tenho de acreditar que gostavam sim... espero...
terça-feira, 17 de abril de 2007
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