2001. “Dor de dente na perna”. Não existe melhor definição par a dor de um enfarte arterial em um membro, seja ele qual for.Estava em um impasse: cortar ou cortar. Convoquei alguns amigos médicos para resolvermos juntos. Com eles veio um idiota, também médico que fez a sugestão: 6 meses de cama e depois amputar. E é médico, acreditem ou não. Acho que amputaram antes o cérebro dele. Consenso. Ida para São Paulo e amputação. E foi o que ocorreu ao exame no Hospital das Clínicas da USP. Cirurgia marcada para o dia seguinte, em um grande hospital da Avenida Paulista.
Dia da cirurgia, dia de festa. Ninguém entendia nada. A enfermagem achando a coisa mais estranha, todos felizes, eu, minha mulher, meus filhos. Normalmente, nesse caso, tanto o paciente quanto a família ficam com cara de sexta feira santa no interior. É que não haviam presenciado o sofrimento por meses.
Chamam a Ângela para assinar a papelada. Tudo feito. Aí a atendente diz: estranho, você e seu marido tem o sobrenome diferente, não é? Minha mulher confere, o nome era outro, um tal de Luiz. Rasgam tudo e fazem novos documentos. E não é que a Ângela havia autorizado a amputação da perna do Luizão do Corinthians, que estava ali para fazer algum procedimento do joelho? Acho que iria haver algum problema quando ele acordasse e visse que seu contrato milionário já não teria muito valor, né?
À noite no quarto ficam o paciente e 1 acompanhante. Fiquei eu, minha mulher e todos meus filhos. E deixaram tranquilamente, ao ver o clima de esperança e de amor que havia ali. Em um hospital chiquérrimo passamos a noite como em uma cabana de ciganos. Graças a Deus. Uma das melhores noites de minha vida, apesar da dor.
No dia seguinte, a cirurgia. Tudo tranqüilo, uma dor de matar quando acabou a raqui, que acabou se transformando em geral. Tenho esse problema. Quando faço raqui não sinto nada, mas quando ela acaba relembro cada momento da cirurgia, e no caso me senti como em um campo de batalha, sem anestesia, e fazendo a amputação a seco, com um serrote de lâmina cega. Perdôo meu pior inimigo, que felizmente não tenho, de entrar numa dessa. Foram 8 horas de dor angustiante, eu pedindo a morte e ela não vindo. Ao completar esse tempo a dor passou totalmente e nada mais senti. Estava livre!
Vocês já viram aqueles seguranças, cheios de radinhos, ternos pretos, óculos escuros? Pois bem, alguns deles foram falar com a Ângela, para retirar a perna amputada. E então? Fazer o que com a dita cuja? Minha mulher foi ao supermercado, comprou uma bela caixa plástica, colocaram formol, acondicionaram a peça e iríamos trazer para Itajubá, para o Jarbas de Brito estudar. Aí complicou tudo: como trazer? E a policia? Se achassem a perna iriam querer saber onde estava o resto do cadáver, dizia uma freirinha baixinha, gordinha, velhinha, chatinha...Depois de muito tempo foram, ela e minha mulher, de braços dados, para a funerária de outro hospital. E deram as opções: carro funerário para Itajubá, um caixão, etc, ficava em 2000 reais! Que que é isso? Discordância. Outra opção: cremação em um hospital sei lá onde, com registro, 600 reais. Tudo bem, mas aí apareceu outra opção: enterrar como indigente, mas com um inconveniente: nós não acharíamos mais a perna! Que tristeza! Eu nunca mais veria aquela perna que tanto me fez sofrer! Hilário. E lá se foi minha perna como perna de indigente. No juízo final talvez isso me complique um pouco, mas até lá talvez as células-tronco talvez me regenerem outra, como o rabo de uma lagartixa.
Beleza, eu feliz da vida, e fui com o Vlamidir da Unimed e a Ângela fazer o controle no consultório de meu medico. Só que eu, com o andador, me esqueci que havia virado saci. E dei um passo com a perna que não tinha. E me ferrei no asfalto, com sangramento, parada de trânsito, com direito a desmaio, a primeira vez em minha vida, como uma daquelas mocinhas de antigamente. Cacetada!
Tudo passou, a prótese funciona. Agradeço a Deus por tudo, e principalmente por ter me dado a mulher e os filhos que me deu, muito mais do que mereço. Obrigado, Senhor!
terça-feira, 17 de abril de 2007
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